Plásticos de uso único em maré de observação
Os mares e os rios suscitam preocupações em várias frentes como a da contaminação dos ecossistemas por aditivos químicos provenientes de plásticos de uso único. Conhecer e quantificar os riscos é condição indispensável para reforçar o ecodesign das embalagens e ajudar a minimizar os impactes ambientais. Esta é a essência e o propósito do IRAtox (Índice de Risco Aquático de Toxicidade). Um projeto da NOVA ID FCT, através do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE), envolvendo um conjunto de entidades parceiras e, é claro, o incentivo da Sociedade Ponto Verde.
O projeto IRAtox* nasceu da necessidade de abordar um problema crescente: a contaminação ambiental causada por aditivos químicos que são libertados pelos plásticos descartáveis, particularmente em ecossistemas aquáticos. “Entre os plastificantes utilizados para melhorar a flexibilidade, durabilidade, elasticidade e maleabilidade dos plásticos, adaptando-os a diversas aplicações, destacam-se os ftalatos, que representam cerca de 80% do total. Estes compostos podem ser libertados para o ambiente ou migrar para os alimentos, especialmente através do processo de lixiviação, agravado pela degradação e fragmentação dos plásticos”, explica Carla Silva, investigadora do MARE e responsável do projeto IRAtox, acrescentando que “este fenómeno pode aumentar os riscos para os ecossistemas e a saúde humana, dado que muitos destes compostos são conhecidos por serem disruptores endócrinos, serem carcinogénicos e estarem associados à diminuição da fertilidade”.
Bióloga e com formação específica em Ecotoxicologia, a investigadora faz notar que nesta fase final de desenvolvimento do projeto ganha consistência as bases para uma ferramenta prática diferenciada para quantificar os riscos ambientais destes aditivos químicos e, a partir daí, apoiar decisões informadas a tomar por reguladores e produtores de embalagens. “O índice IRAtox, aliado à criação de uma escala de risco, irá reforçar o ecodesign das embalagens e ajudar a minimizar os impactes ambientais associados aos plásticos descartáveis”, argumenta Carla Silva.
O conhecimento como fonte de vida
Movida pela necessidade de criar uma base de dados ecotoxicológica, a investigação no contexto do IRAtox, centrada nos efeitos causados pelos ftalatos, passou pela realização de testes de ecotoxicidade de aditivos1 em organismos nos diferentes patamares da cadeia alimentar (ou níveis tróficos), como bactérias bioluminescentes, microalgas e invertebrados aquáticos.



“Os resultados”, sublinha Carla Silva, “demonstram diferentes níveis de toxicidade consoante os organismos e concentrações de teste, destacando o efeito potencial dos aditivos em processos biológicos cruciais como a perda de bioluminescência das bactérias, a inibição de crescimento das microalgas e a imobilização das dáfnias”. O IRAtox vem, igualmente, contribuir para o desenvolvimento de uma metodologia de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), integrando os dados experimentais em modelos de Avaliação de Impacte do Ciclo de Vida (AICV). A investigadora responsável do projeto defende que “esta abordagem melhoraa precisão na estimativa dos impactes ambientais dos aditivos químicos dos plásticos”. Com base nos dados gerados, foram derivados novos fatores de impacte, que permitem avaliar a ‘pegada química’ destes compostos ao longo do ciclo de vida dos plásticos, assegurando uma análise detalhada e alinhada com as diretrizes internacionais.
“Os resultados deste estudo têm uma importância significativa para iniciativas de sustentabilidade e gestão de resíduos plásticos”, conclui Carla Silva, frisando que ao fornecer dados ecotoxicológicos atualizados e parâmetros de efeito, o projeto contribui para a inclusão dos aditivos químicos na ACV do plástico, promovendo práticas mais sustentáveis na produção, distribuição, uso e descarte.
Acresce que o IRATox vem demonstrar um caminho integrado entre a produção de dados laboratoriais e a sua aplicação prática, para uma compreensão mais detalhada dos riscos associados a estes compostos.
A Sociedade Ponto Verde saúda, naturalmente, as boas notícias para o futuro dos mares e dos rios, neste vasto oceano de desafios que é a sustentabilidade do Planeta.
1 como o dioctil tereftalato (DOTP), o diisononil ftalato (DINP) e o di-isodecil ftalato (DIDP).
Nota: apesar de frequentemente apresentado como uma alternativa mais segura e sustentável em relação aos ftalatos tradicionais DINP e DIDP, o DOPT revelou-se mais tóxico em dois dos bioensaios realizados, levantando preocupações adicionais sobre o seu impacte ambiental.
*Este é um projeto apoiado e cofinanciado pela Sociedade Ponto Verde no âmbito do seu Programa de I&D